Casa Baco e Baco Pizzaria: o Cerrado bem servido
Frequento Brasília há muitos anos por causa da advocacia. É uma cidade que aprendi a gostar, mas que, com todo respeito, por muito tempo teve uma cena gastronômica que não fazia jus ao título de capital do país. Havia bons endereços, claro, mas a oferta era limitada e repetitiva, como se a cidade tivesse esquecido que está cercada por um bioma rico, diverso e cheio de histórias.
Foi nesse terreno que o trabalho de Gil Guimarães floresceu. Mineiro, morando em Brasília desde os 11 anos, ele entendeu que cozinha boa não precisa importar identidade justamente porque ela nasce de um olhar para dentro. O Cerrado virou seu eixo criativo e seus restaurantes mostram que é possível fazer uma gastronomia autoral, sólida e com sabor brasileiro.
Na Casa Baco, comecei pelo Capiau, bolinho de canjiquinha recheado com requeijão do sertão e linguiça caipira. É uma entrada simples, bem executada, com textura leve e sabor direto. Em seguida veio o tartar de pirarucu de manejo, cortado na ponta da faca, temperado com tucupi, cajuzinho-do-cerrado e castanha de baru. Fresco e intenso, é um prato que traduz a paisagem e a alma do Cerrado sem precisar explicar nada.
A carne de sol, servida com baião de dois e picles de maxixe, tem presença e identidade. Uma das fatias veio mais firme do que o ideal, embora as demais estivessem no ponto e suculentas. É um detalhe que não compromete, mas mostra como pequenos ajustes fazem diferença em uma cozinha que se leva a sério.
As sobremesas mantêm o mesmo cuidado. A torta de chocolate é feita com a barra de 42% da LaBarr Chocolate, marca de Brasília que trabalha do grão à barra, com cacau brasileiro e produção artesanal. A leveza da torta surpreende, nada de excesso de açúcar, apenas equilíbrio e textura, e a combinação com nibs e flor de sal fecha a refeição com elegância.
Já na Baco Pizzaria, o forno conta outra história, mas com a mesma coerência. A pizza Assassina é inspirada no spaghetti all'assassina. Leva 'nduja (embutido calabrês feito com carne suína e pimenta), conhecido pela picância e textura cremosa e surpreendentes fios de spaghetti torrados. O resultado é uma pizza crocante, curiosa e cheia de personalidade. Um prato que provoca e diverte ao mesmo tempo.
A clássica Vera Margherita mostra o domínio da técnica: mozzarella de búfala, pomodoro pelati, grana padano, manjericão e azeite extra virgem. Já a Cerratense é um manifesto local: mozzarella de búfala defumada, linguiça caipira, pesto cerratense, passata orgânica e praliné de gergelim Kalunga.
Outro ponto forte da Baco é a carta de vinhos. Além de rótulos internacionais, há uma seleção de vinhos do Cerrado, de vinícolas como Casa Vitor, Solo Fértil, Croqui, Terroir Girassol e BSB. São vinhos de altitude e colheita de inverno, produzidos no Distrito Federal e em Goiás. Ter vinhos regionais harmonizando com pizzas e ingredientes locais reforça a ideia de que a ideia de Gil não é apenas cozinhar, mas sim privilegiar ecossistema de sabor.
Em tese, Gil não discursa sobre regionalidade: ele a pratica. Valoriza pequenos produtores, ingredientes do Cerrado e vinhos locais com a mesma atenção que dedica à massa da pizza. Isso faz com que seus restaurantes tenham coerência, algo raro e valioso.
Mesmo com um detalhe ou outro que pode melhorar, como a carne de sol um pouco mais firme, o conjunto é sólido. A Casa Baco e a Baco Pizzaria mostram que Brasília pode, sim, ter uma cena gastronômica à altura de sua importância.
Serviço:
Baco Pizzaria | CLS 408, Asa Sul, Brasília | Horário de Funcionamento: Domingo a quinta-feira: 18h às 23h30, Sextas, sábados e feriados: 18h às 00h | @bacopizzaria
Casa Baco | ST SGCV/SUL Lote 22 LOJA 105, Park Sul; Brasília Shopping: Setor Comercial Norte, Quadra 05, Bloco A; e Mané Mercado: Arena BRB Mané Garrincha, Eixo Monumental | Horário de funcionamento: Segunda a quinta: 12h às 15h30 e 18h às 23h30, Sexta: 12h às 16h e 18h às 00h, Sábado: 12h às 00h e Domingo: 12h às 23h30 | @casa.baco
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